Você deveria mudar!
No consultório de um
filósofo de vez em quando aparecem pessoas que querem mudar, achando que o seu
modo de viver é errado. Estas pessoas entendem que a maneira como vivem ou agem
diante das situações da vida está errada e por isso precisam mudar. No entanto, não
raras vezes, depois que o filósofo colhe os dados da historicidade da pessoa
descobre que não há nada de errado. Na verdade o que acontece é que o pai, a
mãe, o tio, um amigo, uma pessoa que a encontrou em um curso de final de
semana, lhe disse que ela estava equivocada no seu jeito de ser. Ao ouvir a
sentença do outro sobre seu jeito de ser, a pessoa entende que seria ideal
mudar, pois ela não quer estar errada se há um jeito certo.
Em Filosofia Clínica, um
dos princípios básicos é a singularidade, ou seja, para um filósofo clínico
cada pessoa é única. Por isso, ao receber uma pessoa em seu consultório ele
nada mais sabe do que aquilo que se apresenta em sua frente, se a pessoa é
alta, baixa, magra, gorda, loira, morena, enfim. Esse entendimento faz com que
o terapeuta filosófico olhe para cada pessoa como um fenômeno único, que jamais
se repetirá, ou seja, é singular. Com base nesse princípio, quando ele ouve uma
pessoa, entende que seu modo de ser é assim por uma série de razões, que muitas
vezes a própria razão desconhece.
Mas, para muitas pessoas acostumadas
a verem a novela das sete, os filmes de Hollywod, A Fazenda, Big Brother, para
estas existe um padrão social do qual todos são reféns e têm de se adaptar. Por
isso escutam-se muitas vezes cursos e livros anunciando, por exemplo, “receita para
uma mulher poderosa”, onde existe uma lista de predicados necessários a uma
mulher para fazê-la poderosa. No entanto estes textos deixam de lado a
singularidade, levam em conta um padrão, um modelo estereotipado de mulher
poderosa. Imagine você, o que seria uma mulher poderosa: pode ser que seja uma
mulher alta, curvilínea, imponente, sedutora, falante, expressiva, será que
essa é uma mulher poderosa? Pode ser que seja apenas uma fachada escondendo uma
mulher tímida que sofre muito pode ter de fazer de conta ser alguém que não é.
De acordo com a história
de vida de cada pessoa pode-se ver que algumas mulheres são tímidas porque
aprenderam que homens gostam de mulheres mais recatadas. E, do seu jeito
aprenderam a lidar com sua timidez, dominam o lar, o marido e os filhos, mesmo
com a timidez. É básico em Filosofia Clínica e até mesmo para a vida entender
que, em cada contexto características peculiares podem ou não ser bem vindas.
Imagine que essa mulher tímida, pouco expressiva, quase invisível se torne uma
mulher poderosa, faça um curso que mude a sua vida. Agora ela é uma mulher
poderosa, mas uma péssima mãe, deixa o marido de lado, perde os valores do
casamento e assim por diante. O poder que ela acumulou de um lado, fez dela uma
mulher fraca de outro, o que era para ser uma qualidade acabou por se mostrar
seu mais novo defeito.
Mas, não se pode dizer
que não se deve mudar, claro que se pode mudar, mas ao fazer isso, cuidar para
que você se torne cada vez mais você mesmo. Para isso invista naquilo que é
seu, que faz parte de você, deixe de pensar que o jeito do outro é o correto ou
melhor. Quando alguém lhe recomendar que você deve mudar, antes de mais nada,
veja se essa pessoa é um bom exemplo naquilo que diz. Mais ainda, veja se o seu
estilo de vida combinaria com o dela ou se a sua história de vida é igual a
dela. Provavelmente cada um tem sua história, seu jeito de ser, sua
singularidade e se precisa mudar, não é para ser um marionete social.
Rosemiro A. Sefstrom