Encontro Nacional

Encontro Nacional

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Pais e mestres!

Quando era pequeno observava meu pai como um ídolo, um homem capaz de conquistar a mulher por quem eu tinha tanto amor. Vendo este ídolo queria ser igual a ele, vestia sua camisa de trabalho, pois era nessa hora que ele ganhava o beijo, colocava seus sapatos, mostrando já ser “grande”. Queria comer as mesmas comidas que ele colocava no prato, ver os mesmos programas de televisão vistos por ele, me divertir com os mesmos programas de lazer que o divertiam. Meu pai era um mito de perfeição, um exemplo vivo de como seguir minha vida para conquistar uma mulher como a que eu amava.

Aos poucos fui crescendo, percebendo outras realidades além da minha, fora dos muros de minha casa. Entendi que existiam outras mulheres para serem conquistadas, mas ainda assim, meu exemplo de como fazê-lo vinha do meu maior mestre, meu pai. Ao ir em busca dos meus amores percebi que reproduzia não só os comportamentos afetivos de meu pai, mas que buscava o que buscava com o mesmo afinco que ele o fazia. Percebi que mesmo tendo sonhos diferentes, era a mesma forma de sonhar. O estranho é que muitas vezes conversamos como deveriam ser as coisas para mim, que eram outros tempos e outras experiências. Mas, mesmo em outros tempos, com outras experiências, meu espírito de vida se preparara para cada desafio junto com ele. Assim, em cada desafio que enfrentei na vida um pouco dele esteve comigo.

Hoje tenho filhos, um em casa e muitos fora dela. São crianças que encontro pelas ruas, filhos de amigos, conhecidos, parentes, estranhos e aqueles pelos quais nutro um carinho especial, meus alunos. Como posso saber o que vão aprender do que eu ensinei? Alguns deles lembrarão de minha palavras até o fim de suas vidas, lembrando frases, jargões, brincadeiras, piadas. Mas sei que alguns deles amanhã esqueceram minhas palavras, mas lembram como me vestia, como cortava o cabelo, o que comia, o que bebia, como demonstrava meu carinho e até mesmo minha raiva. Mas, sei que haverão ainda outros que não lembrarão de minhas palavras ou de como me comportava e vestia, mas lembrarão que era o “professor”.

Esse é o tamanho de nossa responsabilidade frente a cada pessoa com quem conversamos, com quem vivemos. Se olhar para suas crianças, de seus vizinhos, aquelas que encontram pelas ruas, vai se orgulhar do que está ensinando? Como as pessoas que convivem com você irão lembrá-lo? Somos um espelho existência, a partir do qual muitas pessoas medem a própria existência. Você está feliz com o que herdou dos seus pais? O que está ensinando?
Pense nisso!


Rosemiro A. Sefstrom

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Opinião

Vivemos no país um momento estranho, onde a revolta é algo defendido e contestado ao mesmo tempo. Os que defendem o direto de revolução tem por base a filosofia de John Locke, mas muitos outros justificam o dever do governo de fazer o necessário para continuar no poder, conforme pregava Maquiavel. Mas em qualquer um dos casos o comportamento tem por base uma verdade a respeito do momento que vive nosso país. Para alguns vivemos um golpe de esquerda, o “petismo” que toma o poder com base nas teorias de Gramisci, pelas beiradas, pela base. Outros acreditam que vivemos o cúmulo da corrupção e o absurdo do descaramento onde os políticos se apoderam do público fazendo-o privado. E agora? Qual é a verdade? Existe uma?
Para elucidar esta questão recorro a Platão, filósofo que tratou de modo magistral o significado de opinião e ciência. Para ele a ciência nos leva ao conhecimento do Ser e a opinião leva a julgar pelas aparências. Ainda segundo Platão a opinião está entre a ciência e a ignorância, sendo que para ele a opinião tem traços de coisas que levam o homem ao conhecimento, assim como também tem traços de ignorância. Em outros termos, ter opinião não é ser totalmente ignorante sobre um assunto assim como também não é ser totalmente sábio. É bom e producente ter uma opinião, mas também entender que a opinião não é uma ciência. Quanto mais uma pessoa conhece sobre um assunto, mais sua opinião é válida porque menos ignorante é.
Com leituras atentas, acompanhando notícias das mais variadas é possível elaborar as mais diversas opiniões sobre qualquer assunto, mas conhecimento é para poucos. É possível ler comentários de toda ordem sobre o momento nacional, mas são poucos os que podem afirmar com grande certeza como serão os próximos capítulos. Purificar o que se lê, o que se vê pela televisão é um bom caminho para sair das opiniões mais ignorantes para as opiniões mais sábias. Ainda assim a opinião é o que resta, ou seja, é o julgar pelas aparências.
Em nossa região, independente do momento cívico nacional, com os PECs e outros assuntos, é hábito julgar pelas aparências. Vive-se o dia-a-dia como um teatro de sombras, onde cada um posiciona a luz de modo a criar a melhor sombra aos outros. Esse é o grande problema, enquanto prestam atenção às colunas sociais, ao sensacionalismo, à imagem caricata, o que realmente tem de ser visto passa despercebido. No dia-a-dia mais e mais regras, menos direitos e mais deveres, mais direitos aos políticos e menos aos cidadãos. Se isso é uma verdade ou uma opinião, não sei, é algo que estamos presenciando. Fechar os olhos e achar que tudo vai continuar igual é a maior prova da inaptidão para ver.
Sair da opinião que são as sombras da caverna do mito platônico na direção do sol que se apresenta como conhecimento é o grande desafio. Sócrates, personagem principal do Mito da Caverna, queria tirar os homens da opinião e levá-los ao conhecimento e pagou com a vida. Pelo mundo houve muitos que tentaram gritar aos ouvidos de quem quisesse ouvir e pagaram também com a vida, tais como Gandhi, Martin Luther King. Os que ouvem a verdade, mas estão acostumados a viver de opiniões entre a ciência e a verdade, podem estar confortáveis assim. A opinião para muitos é mais do que julgar pelas aparências, é estilo de vida.

Rosemiro A. Sefstrom

quinta-feira, 26 de junho de 2014

O QUE VOCÊ ACHA?

“Olha, estou com alguns problemas e queria ver se você não pode me ajudar. Sou casado há mais de vinte anos e não estou tendo uma boa relação com a minha esposa (o). O que você acha que eu devo fazer?” Muitas conversas começam assim, com perguntas aparentemente despretensiosas e que parecem pedir um bom conselho, são até interessantes no sentido de se pensar num alternativa ao problema proposto. Mas devemos considerar que aquele que fala não nos explicou absolutamente nada do que quer dizer por “casado há vinte anos”. Mesmo que todos aqueles para quem ele perguntasse a respeito do assunto tivessem vinte anos de casado, seria com a mesma mulher? Bom, vai que por uma ironia do destino exista alguém que casou com a mulher de outrem e que agora também completa vinte anos de casado, esse casal tem a mesma história do casal anterior?
Um filósofo pouco conhecido, mas muito importante para a filosofia chama-se Protágoras, segundo ele “o homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das que não são, enquanto não são”. Antes de explicar o que ele disse vou consultar um outro filósofo, que anos mais tarde diria com outras palavras, assim diz Schopenhauer  “o mundo é minha representação”. Com estas duas frases os filósofos colocam a questão de que, quando você olha pela janela, sente a brisa que acaricia seu rosto e o perfume das flores no jardim é assim somente para você. Se sua mulher, estiver justamente á seu lado, paradinha sentindo a brisa e o perfume das flores, para ela a experiência será totalmente diferente. Pode ser boa para ambos, mas em cada um será diferente.
Retomando a pergunta acima com a colaboração dos filósofos acredito que entramos em um beco sem saída, pois não sabemos o que é ser casado há vinte anos. Assim como também não sabemos o que é não ter uma boa relação com a esposa. Mas como poderemos saber tudo isso? Uma boa sugestão é ouvir, seguir os passos de Sócrates e me afirmar ignorante diante daquilo que vou escutar, ou seja, nada sei sobre o outro e é ele que vai me ensinar. Então, perguntamos ao que procura ajuda, o que são estes vinte anos de casado, ou seja, qual a história deste tempo de casamento. Depois que ele o tiver explicado esta parte podemos interrogá-lo a respeito de ter uma boa relação, assim como ele diz, o que quer dizer ter uma boa relação?
Quando tiver todas as informações e entender o que é ser vinte anos casado e não ter uma boa relação com o cônjuge, aí sim estarei perto de dar algum direcionamento. Mas como? Todo direcionamento que der será como eu faria as coisas, como a velha pergunta: “No meu lugar, o que você faria?” Não é o caso, agora já sabemos o que são os conceitos para a pessoa e podemos dizer à pessoa como ela pode retornar. Uma das coisas que posso fazer é prestar atenção na história que ele me contou dos vinte anos de casamento e perceber que ela ama flores e que ele tinha o costume de presenteá-la com lindos buques. Percebendo isso posso recomendar que ele leve flores na volta para casa, que compre um ramalhete das flores que a mulher adora. Posso ter escutar na história do casamento que a mulher adora passear e faz muito que entraram na rotina, casa, trabalho. Neste caso recomendo à ele que leve a mulher para passear, visitar um lugar que faz tempo que não vão.
Assim como para qualquer médico, que cuida do corpo, também o é para o terapeuta que cuida da mente. Precisamos conhecer bem os problemas, as dificuldades que a pessoa nos traz e entendê-las a partir da própria pessoa. Somente assim estarei medicando as dores existenciais daquela pessoa não  o que acho que ela tem.

Rosemiro A. Sefstrom 

terça-feira, 24 de junho de 2014

O que eu acho que tenho!

Há um ditado que diz que uma mentira contada muitas vezes se torna verdade, segundo alguns historiadores esta frase é atribuída a Joseph Goebbels. Apenas por curiosidade, Goebbels foi o ministro da propaganda que acompanhou Hitler como governante alemão. Outra versão ainda diz que uma mentira se torna verdade à medida que o próprio mentiroso acredita nela. Numa outra versão se diz que uma mentira se torna verdade quando é aquilo que queremos ouvir. Digo isso para falar um pouco sobre o auto-diagnóstico, pessoas que ao verem um programa de televisão, lerem um livro ou até mesmo numa conversa de amigos descobrem que são doentes.
Comecei a falar a partir da mentira por causa dos sintomas. O que é um sintoma? Quando uma pessoa percebe que algo nela está diferente, no seu corpo, no seu pensamento, no seu relacionamento, enfim, na sua vida, podemos falar em sintoma. O sintoma, ou seja, a alteração, só pode ser percebida pela pessoa. Caso seja relatado por outra pessoa passa a ser sinal. Vamos mostrar a diferença: se você passa na rua e vê alguém tossindo, isso é sinal de gripe, claro que quem está dizendo isso é você. Agora, se chegar até a pessoa e perguntar a ela o que passa, pode ser que ela diga que estava se engasgando. Essa é uma problemática bastante difícil na área das terapias, muitos livros dizem o que está de errado na vida da pessoa sem sequer conhecer a pessoa.
Quando uma pessoa relata o que está vivendo, com todas as questões, ela está relatando seus sintomas, ou seja, sua percepção a respeito de suas coisas. Mas muitas vezes, no contato com amigos, livros, revistas, programas de televisão, a pessoa acaba recebendo informações que combinam com muitas de suas percepções. A partir dessa combinação entre as informações e aquilo que ela percebe como sintoma a própria pessoa se dá o diagnóstico. É assim que nascem muitos dos hipocondríacos que conhecemos, pessoas que se automedicam por combinarem informações e sintomas. No entanto, quando uma pessoa fica doente e tem a percepção de alterações na sua vida ela procura um médico. O médico, profissional preparado, reune todos os sintomas da pessoa com as informações que tem a respeito das doenças conhecidas e dá o seu diagnóstico.
No dia a dia muitas pessoas não percebem as pequenas alterações que têm em sua vida, só vão perceber quando alguém diz. Ai nasce o problema, quase que filosofal: “Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?” Aqui não é diferente, quem veio primeiro, a informação de uma pessoa que traduziu um sinal ou o sintoma que só foi percebido porque a pessoa falou? É ai que entra a questão da mentira. Muitas pessoas não têm os sintomas, mas alguém disse que elas têm, então passa a ter. Usando uma expressão popular, é aquela coisa da vizinha que diz: “Nossa, vi na televisão que quem repete mais de uma vez a mesma coisa é obsessivo compulsivo”. Até aquele dia a pessoa nunca tinha notado que repetia mais de uma vez, depois que a outra falou ela percebe. E agora, já era problema ou se tornou problema?
Um empresário pode achar que sua empresa está em crise porque algum amigo disse que sua empresa está com sintomas de crise. Uma mulher pode achar que seu marido a está traindo porque uma amiga disse que os sintomas indicam isso. Lembre-se de que cada um percebe os seus sintomas, mas saber se o sintoma é realmente uma doença, problema, dificuldade, isso deve ser feito por quem entende do assunto.


Rosemiro A. Sefstrom

segunda-feira, 23 de junho de 2014

O filho exemplar

Há em Filosofia Clínica um tópico chamado Buscas. Esse tópico se ocupa em identificar na história das pessoas seus direcionamentos existenciais. Há também um tópico da Estrutura do Pensamento chamado Termos Unívocos e Equívocos. Este tópico trata da clareza como as informações são expressas e o quanto são entendidas. Se uma informação sai de uma pessoa e é plenamente entendida pelo outro, esta é unívoca, caso não seja entendida ou seja mal interpretada, diz-se que a informação é equívoca. Se pensarmos no caso de uma pessoa que une buscas com termos equívocos, pode-se dizer que estamos diante de alguém que quer chegar a algum lugar, mas não tem clareza de onde quer chegar. Quando isso acontece, a pessoa aponta para várias direções ao longo da vida, a cada tanto inicia uma nova jornada de busca sem chegar a lugar algum. Muitas pessoas padecem por não conseguirem decifrar claramente qual seria a melhor direção existencial, sofrendo por não saberem se caminham em direção ao que parecem querer.
Agora imagine que essa equivocidade, essa falta de clareza, não aconteça com você, mas com seu pai, que ele seja equívoco no que busca. Pense que este pai tem como objetivo de vida educar seus filhos para que sejam responsáveis, sinceros, justos, trabalhadores, estudiosos, enfim, que sejam pessoas que ele considera de caráter. Pode acontecer que este pai deseje esse modelo de educação para seu filho, mas faça exatamente o contrário na prática. Algumas ilustrações podem deixar claro como isso pode acontecer e quanto sofrimento pode provocar. Colocarei alguns relatos que já ouvi no trabalho como terapeuta.
Uma jovem moça me falou que seus pais sempre disseram que queriam formar uma mulher responsável, que queria que ela fosse um exemplo. No entanto, ouvindo sua história de vida, pode-se perceber que seus pais fizeram tudo ao contrário do que desejavam. Desde cedo a menina não tinha hora para acordar, nem hora para ir dormir, quando lhe era exigido arrumar o quarto ela chorava, esperneava e assim era dispensada da tarefa. Quando mais jovem ia à escola e tinha um comportamento já bem rebelde, seus pais chamaram a atenção dos professores em sua frente, dizendo que eles deveriam saber o que fazer com seus alunos. Com essas e outras situações criaram alguém que não corresponde aos seus objetivos.
Outro rapaz me contou um dia que seu pai queria que ele fosse um jovem trabalhador, empenhado em resultados. Porém, ao longo de sua história, percebe-se que seu pai desde cedo desobrigava o rapaz das tarefas do lar. Em casa quando ele bagunçava seu quarto, era a empregada que limpava, quando queria qualquer soma em dinheiro, facilmente conseguia, os trabalhos de escola eram feitos pela mãe. Quando foi convidado para trabalhar com seu pai não tinha horário para chegar, assim como não tinha para sair. Quando entendia que não precisava ir ao trabalho, simplesmente não ia, sequer dava satisfação, deixando toda uma equipe desfalcada. Para o pai isso era coisa da idade, agora ele está com quase trinta anos e ainda não chegou à idade responsável.
Os casos citados são de pais que cobram dos filhos o que nunca lhes foi ensinado, queriam que os filhos fossem pessoas com determinadas características, mas não lhes ensinaram a ser. Alguns queriam filhos exemplares, mas não lhes ensinaram a ser os exemplos que desejavam. Muitos dizem: “Não quero para o meu filho o que eu passei”. Estes mesmos não se dão conta que muito do que passaram foi o que ajudou a formar o que são hoje. Estes pais buscam equivocamente que o filho seja como eles, sem educar para que o sejam. Filhos exemplares, na maior parte dos casos, foram frutos de uma educação exemplar.

Rosemiro A. Sefstrom

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Causa Eficiente

Há um bom tempo aprendi em Filosofia Clínica que o papel de um professor é potencializar as características de um aluno de modo a promovê-lo a partir de si mesmo. Numa organização, qual o verdadeiro papel do líder? Não seria exatamente o mesmo, ou seja, potencializar em seus liderados o que eles têm de melhor? Ser líder, entre outras coisas é ter a capacidade de identificar no liderado as capacidades a serem desenvolvidas e propiciar um ambiente adequado para o seu desenvolvimento. Para ilustrar o processo de um bom líder podemos tomar por base Aristóteles, sendo que ele foi o preceptor de Alexandre da Macedônia. Usarei três conceitos do filósofo para ilustrar a formação de um líder, são eles: potência, ato e causa eficiente.
O primeiro dos conceitos é potência, o qual mostra tudo aquilo que está esperando as condições adequadas para aparecer. Pode-se citar o exemplo de uma semente, nela está em potência uma árvore, mas esta só aparecerá quando as condições forem adequadas para isto. Numa pessoa, o líder que é formador percebe em seus liderados quais são as capacidades que estão apenas como potência, ou seja, as capacidades que ainda não encontraram as condições para aparecer. Em muitos casos o colaborador é dedicado, pontual, pró-ativo, busca melhorar a cada dia, mas falta-lhe amadurecer algumas características. O líder formador consegue perceber os potenciais, sabe que aquele ou aquela colaboradora tem algo que precisa ser cultivado para que aconteça. Desta forma, pode-se dizer que um líder que não forma outros líderes provavelmente não consegue ver no outro potenciais, capacidades a serem desenvolvidas. Desta forma pode-se questionar se ele é de fato um bom líder.
Outro conceito é a causa eficiente, o qual remete-se ao que faz com que o movimento aconteça. A causa eficiente pode ter como exemplo o movimento de uma bicicleta que tem como causa eficiente o homem que pedala. Desta forma o líder que se torna causa eficiente é aquele que percebe a potência do colaborador e faz com que ela aconteça. O líder percebe que seu colaborador tem em potência criatividade e se torna causa eficiente dando ao colaborador a oportunidade de trabalhar no setor criativo da organização. O mesmo pode acontecer com um colaborador que tem como potência a organização, o controle, e este é convidado pelo seu líder para cuidar do estoque, fazendo com que a potência aconteça. Todo líder que se torna causa eficiente é um líder que provoca movimento, pois toda causa eficiente faz com que aconteça a passagem da potência ao ato.
O ato é aquilo que é, que se tornou real, fato. Assim, quando a organização tem um líder que é causa eficiente, ele percebe quais são os potenciais de seu colaborador e cria as condições para que estes potenciais se tornem em ato. O líder causa eficiente conhece seus liderados a ponto de saber seus potenciais e como é necessário agir para que este potencial se torne ato. Quando esta relação entre causa eficiente, potência e ato está harmônica o líder se relaciona com o colaborador como formador de outros líderes. Quando um líder é formador começam a aparecer as equipes de alta performance, ou seja, todos os potenciais são aproveitados da melhor maneira.
Não é preciso estar dentro de uma organização para ser causa eficiente. Um pai, por exemplo, pode perceber nos seus filhos quais são os potenciais e criar as condições para que eles se tornem ato. Um bom professor pode perceber em seus alunos os potenciais, um bom agricultor pode perceber nas suas terras os potenciais. O grande desafio não é criar as condições, mas criar as condições de acordo com a pessoa e seu potencial. O motivo pelo qual alguns líderes têm dificuldades para formar seus liderados, é o fato de não conhecem seus colaboradores.

Rosemiro A. Sefstrom

terça-feira, 17 de junho de 2014

Não sou pessimista, sou realista!

Quando era pequeno costumava subir no mudo de casa com um pedaço de pano amarrado ao pescoço e pular. Quando pulava do alto do muro de pouco mais de um metro, me sentia como se estivesse voando, era uma sensação tão boa que repetia esse movimento várias vezes, até ficar exausto. Era o próprio super homem voando para salvar pessoas, ajudar os necessitados. Outra coisa que costumava fazer era sentar no pátio, pegar meus carrinhos e planejar como seriam as estradas, casa, garagem. Nestes e outros tantos momentos de minha infância vivia um mundo de mentira, uma realidade inventada em minha cabeça. Essa realiade não era verdadeira, eu sabia disso, mas nada me impedia de um dia após o outro brincar neste mundo de faz de conta.
Então cresci, passei a olhar o mundo com outros olhos, aprendi a ver a realidade e não ir mais ao mundo do faz de conta. Essa nova realidade que aprendi a ver é um mundo interessante, nele aprendi a ver as dores, o sofrimento de pessoas que, como meu pai, dormia durante o dia e trabalhava duro durante a noite. Também aprendi a ver a realidade de uma mãe de família que mês a mês juntava os poucos trocados ganhos com um mês de trabalho e tentava alimentar, vestir, educar, manter saudáveis os membros da família. Aprendi ainda que a realidade é aquela em que a verdade é sempre obrigatória, uma necessidade de primeira ordem, quase mais importante do que comer.
O relato mostra o oposto entre a vida criativa de uma criança e a vida calcada na realidade de um adulto. Na vida adulta, tanto uma quanto a outra realidade são parte do discurso: faz parte da vida acordar num dia de domingo, sentar-se na sala, pegar seu video game e se achar o piloto de formula 1. Assim como não tem nada de errado juntar os recibos do mês, colocá-los numa planilha e projetar os gastos dos meses seguintes. O problema que vem ocorrendo são os excessos cometidos por pessoas que se dedicam exclusivamente em criar um mundo de faz de conta, onde a realidade se perde de vista. Na outra ponta existem os casos de pessoas conhecidas por serem verdadeiras, algumas delas cometem o “sincericídio”, ou seja, o ato de assassinar pessoas justamente por serem extremamente verdadeiras, em certos casos, sem necessidade alguma.
O realista é uma pessoa sincera, vê o mundo com uma clareza impressionante, é espantosa a maneira como consegue traduzir com poucas e duras palavras a realidade. Ao sincero o filho com problemas de aprendizado é um vadio, alguém sem a capacidade de aprender o que todo mundo aprende. Para ele o casamento é uma instituição criada pela igreja para dominar as pessoas através de teorias não verificáveis em vida. O salário é um triste fardo a ser administrado de forma que acabe depois da necessidade. Pior ainda: a necessidade continua e o salário já terminou. Existe uma série de predicados que torna uma pessoa realista um bom modelo de vida, alguém que vive a realidade.
Ver um mundo em que tudo deu, está dando ou vai dar errado não é uma boa forma de ser realista. Isto está mais para pessimista. Sentar ao video game e simplesmente brincar de ser piloto de corrida, jogador de futebol ou lutador de luta livre não é deixar de ser realista, mas perceber que a realidade não vai mudar só porque eu faço questão de ver o pior dela.

Rosemiro A. Sefstrom

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Não sei!

Há um tempo em que comecei a estudar Filosofia Clínica, naquele período achava que tinha encontrado o caminho para encontrar as respostas que precisava sobre a alma humana. Parecia bem provável para mim que pela Filosofia teríamos um caminho longo e árduo sobre a alma humana, mas que, ao final, chegaríamos a alguma resposta que pudesse preencher minha alma. No entanto, com o tempo e as aulas que tive comecei a escutar uma incomoda resposta do professor: “Não sei!” Me intriguei com a resposta, principalmente por ser a resposta de um filósofo. Por experiência sei que esta espécie de estudioso costuma ter respostas muito bem elaboradas e construídas, lhes dando certeza do que falam.
Por um tempo continuei acompanhando as aulas e vendo aquele fenômeno do “não sei” permeando boa parte das respostas do filósofo. Mas, como queria saber o motivo de tantas falta de sabedoria para responder às questões feitas sobre o entendimento da alma humana, fiz eu mesmo uma pergunta: “Professor, estou passando por uma fase bastante difícil em minha vida, para tentar chegar a uma resposta preciso de sua ajuda. Minha situação é a seguinte. Tenho vinte e um anos de idade, acabei de me formar na faculdade e estou empregado, meu salário não é grande coisa, mas me mantém. Gosto do que faço, modéstia a parte sei fazer bem aquilo para que fui treinado, mas não tenho gosto pelo que falo, faço mais pelo que vem no final do mês. Agora me surgiu a oportunidade de trabalhar em algo que gosto, que é na área da educação. O primeiro ponto negativo é que o salário que já é peque no vai ficar ainda menor. Depois tenho as contas para pagar e tantas outras pequenas coisas que me dizem que não é viável mudar de profissão. Devo seguir minha razão ou a minha emoção?” O professor olha com tranqüilidade e responde: “Não sei!”
Não agüentei, fiquei bastante chateado e perguntei: “Como assim, não sabe? Segundo a ordem das coisas sou eu quem não sei e você quem sabe, o que acha?” O professor paciente me responde: “Como posso saber quais as orientações de sua vida antes de conhecê-la? Só posso orientá-lo depois de saber sua história de vida, a orientação que sua caminhada tem e como tudo o que está dentro de você se comportará com esta mudança”. Isso me levou a perceber que o que o professor não sabia como eu deveria me comportar com relação às minhas próprias questões. Veja bem, minhas próprias questões. Apontou que para mim, assim como para qualquer um outro seria diferente.
A partir de então percebi que cada pessoa tem uma forma única de ser e por assim dizer, de fazer as próprias coisas. Lembrei dos conselhos dados aos amigos dizendo como deveriam gerenciar a própria vida, seus amores e tristezas. Comecei a examinar alguns dos conselhos e orientações que recebi, para não dizer tudo, a maior parte do que me falaram dizia respeito à pessoa que estava me falando. Por assim dizer, quem dizia que eu deveria chorar quando estava triste é porque pensava que assim deveria todos fazer quando estavam tristes. Quem dizia que dor de amor se cura com outro amor, é porque pensava que todos deveriam comportar-se assim. Com o professor aprendi que para minhas questões sou eu quem tem as respostas e para as questões de outras pessoas, sem saber sua história de vida, sem conhecê-las, “Não Sei!”
Pense nisso!

Rosemiro A. Sefstrom

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Não estou ouvindo nada!

Não é de hoje que escuto histórias sobre pessoas que só ouvem o que querem ouvir. Normalmente pode-se falar de tudo perto da pessoa que ela não escuta, mas se falar sobre algo que a interessa ou chame sua atenção, logo ela se manifesta: “Hã?” Parece estranho, mas isso não acontece só com pessoas mais velhas que usam a desculpa da surdez para não se envolver em alguma questão sem sentido. Esse recurso também é muito usado por pessoas mais novas. Essa “surdez existencial” acontece por alguns motivos, podemos pensar em alguns.
Imagine que você trabalha como vendedor e está com seus produtos ou portfólio mostrando a um cliente que se mostra reticente, nega a compra. Você, como o perspicaz vendedor que é não escuta a negativa e continua tranquilamente argumentando por seu produto. Não é que não tenha escutado, mas é conveniente fazer de conta que não escutou. Essa surdez serve a um propósito: a venda de um produto. Imagine se o vendedor parar de mostrar o seu produto cada vez que receber um não? Quantos produtos você já comprou pela insistência do vendedor? Sem essa surdez, provavelmente o vendedor não sobreviveria com suas vendas.
Outro caso é daquelas pessoas que não ouvem uma parte de si, são surdas para si mesmas. Você, será que é surdo? “Claro que não!”, podes responder, mas acho que muitos provavelmente são surdos para si mesmos. Quantos de vocês já sentiram dores de dente, o corpo já está avisando que é hora de voltar ao dentista, mas nem por isso foi. Há também o antigo, na verdade novo problema criado pela balança. Basta ver a quantidade de pessoas que percebem claramente o corpo dizendo para diminuir a quantidade de alimento, de bebida, mas não param. Um último exemplo desses é a mulher que se casou com um marido violento, a razão dela diz que ela corre perigo, mas nem por isso ela vai embora.
O ouvido, assim como os olhos, os músculos e qualquer outra parte de nosso organismo precisa ser treinado para que tenha um bom desempenho. Um atleta que treina para um campeonato de tiro, enquanto engatilha sua arma e olha para o alvo, presta cem por cento de atenção naquilo que vai lhe dar o resultado. Um maestro, enquanto rege sua orquestra, percebe cada um dos instrumentos, desde a afinação, o tom, o tempo, tudo. Essa atenção se dá pelo objetivo que ele tem, ou seja, fazer com que o som produzido seja o melhor possível.
O problemático é que sem ouvir não há como responder e muitas pessoas respondem mesmo sem entender o que foi dito. São como surdos que erraram a leitura labial, mas respondem mesmo assim. Como saber? Na maior parte das vezes é bastante simples examinar se a resposta tem a ver com o que foi falado, ver se o que é dito tem a ver com o assunto. Pessoas que não escutam frequentemente reclamam de maus entendidos, mas na maioria das vezes elas mesmas provocaram o mal entendido.
Se você disser a sua mulher: “Como você está linda hoje!” e depois disso ela lhe perguntar se estava feia ontem, provavelmente ela não lhe ouviu. Limpe os ouvidos dela dizendo: “Não foi isso que eu disse. Eu disse que você está linda hoje. Não falei de ontem”. É preciso estar atento ao discurso do outro, de modo a ouvir o que ele realmente diz, não aquilo que você quer ouvir.

Rosemiro A. Sefstrom

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Namoro que não dá casamento!

Nos dias atuais, para muitas pessoas me parece que namorar não está mais na moda. Para algumas pessoas isso soa muito estranho, pois para muitos o caminho para o casamento passa pelo namoro. Antigamente o homem interessado em conhecer a moça, literalmente, conhecer a moça, precisava da permissão dos pais dela. Nesse processo de conhecer passavam um bom tempo conversando, apenas conversando. Quando era possível (e dificilmente era) eles pegavam um na mão do outro, quando muito davam um beijinho ou outro, às escondidas. Esse processo lento levava meses, e o homem ia vagarosamente conhecendo a moça até saber se realmente chegariam ao casamento. Ele sabia do que ela gostava, do que ela não gostava, sabia sua religião, se ela queria ter filhos e quantos, enfim conhecia praticamente o que a moça entendia por casamento.
Nos dias de hoje (isso não é regra) o namoro leva tempo quase nenhum e de conversa quase nenhuma. A maioria dos jovens se conhecem, logo estão beijando e não muito tempo depois estão transando. Nesse tempo de namoro tanto um quanto outro falam de muitas coisas, mas pouco do que poderiam e deveriam falar: casamento. Quando, depois de alguns meses de namoro, resolvem casar é que vão pensar sobre o assunto, a festa de casamento. Quando chegam em casa e colocam-se sob o mesmo teto é que começam prestar atenção na pessoa que vai dividir o mesmo espaço. Essa atenção começa a mostrar coisas que não foram ditas no período em que “namoraram”, ou “ficaram” como alguns chamam. Ela e ele não sabiam exatamente o que iriam compartilhar até terem de compartilhar.
Quando os namorados passam a viver juntos colocam, cada um, seus conteúdos em relação ao outro. Por isso é tão importante a convivência, é o momento em que o homem ou a mulher sabe se um realmente é para o outro. Às vezes durante o período que namoravam, a música estava tão alta, a bebida era tanta e as pessoas ao redor eram tantas que ele não conseguiu ouvir que na casa dela quem manda é ela. Ela também pode não ter conversado sobre o hábito que ele tem de ir ao bar, nem mesmo se deu conta que ele não tem o menor problema em comprar e não pagar.
Cada um dos namorados, muito antes de se encontrarem começaram a construir um conjunto de verdades que são a base de suas vidas. As verdades que cada um tem não são verdades finais, como a força da gravidade, mas são princípios de verdade. São pequenos e grandes conceitos que cada um coloca na relação com o outro. Como no caso dos namorados, imagine que a menina não suporta homem que fica devendo para os outros, esse princípio de verdade impediria ela de namorar um homem que não paga suas contas. Quando os princípios de verdade são fortes, por mais que a pessoa goste da outra, suas verdades falam mais alto.
Não existem verdades que sejam boas ou más, certas ou erradas, mas verdades que se tornaram os fundamentos da vida de cada um. Estas verdades, quando colocadas em interseção com outras pessoas podem nos aproximar ou nos afastar, unir ou separar. É importante saber quais são as suas verdades, elas podem estar lhe aproximando de pessoas e coisas boas, assim como o contrário. Talvez seja só no meu mundo que exista isso, mas pessoas que não vêem problemas em comprar coisas roubadas, muitas vezes também são roubadas.
Rosemiro A. Sefstrom

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Mundos

Olhando pela janela, dentro de casa e até mesmo dentro de cada um há uma representação de mundo. Quando alguém diz que o mundo é ruim, mau, bom, certo, errado, isso é assim para a pessoa que disse, da maneira como ela disse. Isso pode ser algo que ela construiu a partir das próprias vivências, pode ser algo gravado do que outras pessoas disseram, também pode ser o resultado de uma longa e bibliográfica reflexão e assim será para cada um. O mundo como uma representação foi uma teoria criada pelo filósofo Protágoras, do qual já se deve ter ouvido falar. Mas outro filósofo mais atual foi além, falou que o mundo é a minha representação, que não existem duas pessoas que vivam no mesmo mundo, assim como não existem duas representações. Sendo assim, em cada um de nós existe um mundo completamente diferente do mundo do outro e é a partir desta visão de mundo que a pessoa se posiciona diante daquilo que a cerca. E é justamente sobre isso que aqui vamos tratar.
Algumas pessoas olham para o mundo como um cenário pronto onde elas precisam se encaixar. Estas pessoas, quando olham para o mundo entendem que ele já está feito e o seu papel é ver o que precisam fazer para se colocar, ou seja, arrumar o seu espaço. Esta visão trata o mundo como coerção, uma realidade esquadrinhada que obriga o ser humano a se adaptar. Em certo ponto Rousseau concordaria com estas pessoas, lembrando que para ele o “homem nasce bom e a sociedade o corrompe”.  Pessoas que vêem a realidade deste jeito comumente usarão frases como: “está tudo pronto, tenho que ver onde me encaixo”. Dentro de uma empresa é aquele funcionário que acha o seu cantinho na estrutura e permanece ali, talvez tenha ambição de evoluir, mas o mais que conseguirá é evoluir para outro cantinho.
Há outras pessoas para as quais o mundo é uma questão de representação: estas são aquelas que entenderão que o mundo é diferente em cada um, como o pregado por Protágoras e Schopenhauer. As poucas pessoas que conseguirem chegar a este ponto terão uma vida em que o outro é um ponto de referência para suas considerações e não uma sentença. Para estas, o fato de alguém não gostar de sua cor preferida, de não entender como alguém pode achar que Deus existe será apenas mais uma opinião. Para saber quem tem o mundo desta maneira basta observar frases como estas: “Isso é assim para você”. Elas entendem que há opiniões diferentes e que devem ser respeitadas, mas não significa que tenham de aceitar. Numa empresa, o funcionário entende que seu gerente vê a empresa de determinada maneira, que não é bom nem mau, mas é assim para ele. E vendo diferente deste, encontra outros caminhos para chegar aonde deseja.
Muito mais raros que os anteriores, será possível encontrar pessoas que tem o mundo enquanto criação. Um mundo que tem sua estrutura pronta, que é diferente em cada um, mas que pode ser recriado a cada dia. Pessoas que olham para a realidade como um caminho de possibilidades, os poucos que ficaram conhecidos pela história ganham títulos diferentes: desbravadores, inventores, criadores, empreendedores e assim por diante. Estes raros seres humanos percebem que é possível ir além do discurso formatado criando possibilidades de ser e fazer diferente. Como no filme Matrix, são pessoas que não se encaixam no que vêem, acreditam no que vêem, mas, muito mais do que isso, acreditam que vai muito além do que está dado. Numa empresa são aquelas pessoas conhecidas como pessoas de criação, que vêem portas em paredes, janelas em muros. Aqueles que imaginam e colocam de tal forma o mundo imaginado que este se torna real.
A boa nova, como diz Lúcio Packter, é que não estamos presos a nenhum destes mundos. Cada pessoa tem a oportunidade de mudar, ir além do momento presente e se construir como um ser melhor. O mundo como coerção, representação ou criação não são bons e nem maus por si só, mas são de acordo com a história de vida de cada um. Quantos empreendedores deixaram de ser um sucesso por verem o mundo por coerção? Observe sua história e veja para onde está caminhando. Se não está gostando do destino de sua caminhada, pode redirecionar.

Rosemiro A. Sefstrom

terça-feira, 10 de junho de 2014

Mudar sem mudar!

Há um tempo, comentava com uma partilhante acerca de uma peculiaridade de nossa região, algo hoje menos visto. Quando eu era pequeno, uma das coisas que me impressionavam eram as casas transportadas em cima de caminhões. Pensava: “como seria possível a um caminhão levar uma casa inteira, levar um lar sobre algumas poucas rodas?”. Hoje mudar de lugar e levar a casa já não é mais possível, a maioria delas é feita de tijolo e cimento. Essa lembrança retrata muitas pessoas que pedem no consultório para mudar de vida, que gostariam de ser diferentes. Mas como seria esse “ser diferente”? Pense um pouco nisso, identifique exatamente o que gostaria de mudar.
Depois de pensar no que queria mudar em você há outra pergunta interessante. O que aconteceria se agora você recebesse uma oportunidade de mudar de vida? Uma das formas de se mudar de vida é ganhando muito dinheiro, boa parte das pessoas que se conhece hoje pensam ser esse o caminho das pedras. Mas nem todas se perguntam como seria se se tornassem realmente ricas. Onde morariam, o que comeriam, ondem trabalhariam, como fariam para manter o status quo. Sim, o que fariam para manter seu padrão de vida, enriquecer não é tão difícil assim, manter-se rico já parece ser um tanto mais complicado. Basta perguntar a uma grande maioria que ganhou nas loterias e hoje vive na pobreza.
Quando se quer mudar de vida, é necessário lembrar que algumas coisas da vida que leva-se hoje terão de ficar para trás. Se quiser ficar rico, a primeira coisa que  terá de deixar é a vizinhança onde vive atualmente, talvez alguns lugares deverão deixar de ser frequentados, inclusive a casa de alguns amigos. Na veradade, alguns amigos irão se afastar por saberem que a diferença entre eles e você torna a convivência um tanto complicada. Indo um tanto mais fundo e sendo mais radical, alguns parentes, pessoas do seu sangue você não poderá mais visitar. Mudar de vida significa abandonar muitas coisas que fazem parte dela agora, e nem todos estão dispostos a sacrificar o que tem para sair de onde estão.
Além de mudar, é necessário fazer amarrações de modo que a mudança tenha sustentação. Ainda há pouco via no jornal as várias tentativas em se tirar os traficantes da vida das pessoas de comunidades pobres do Rio de Janeiro. Mas a maneira como era feito é que não estava certa. Os policiais entravam na comunidade, prendiam os bandidos e se certificavam de que estava tudo em paz. Depois disso deixavam a favela e tudo voltava ao “normal”, inclusive com uma nova facção crimonosa que tomava lugar da que foi presa ou morta. Sustentar pode ser significado como aguentar, tornar comum essa nova situação de vida e alimentá-la. Aos que desejam a riqueza, recomenda-se cultivar o que faz parte desse mundo: a cultura, a leitura, as conversas, as pessoas com quem se convive. Se não estiveres disposto a assumir a condição da riqueza, provavelmente será difícili de “ser” rico.
A palavra mudança está na cabeça de muitas pessoas que buscam a terapia, muitas delas pedem com todas as letras: “Doutor, eu gostaria de ser diferente”. Mas nem todas elas, na verdade em sua maioria, não sabem que para ser diferente precisarão abandonar o que são hoje e adquirir as características do que desejam ser. Infelizmente, algumas coisas têm de ficar para trás, coisas que se gosta, pessoas que se gosta. Além de abandoar também é necessário assumir, tanto coisas que se gosta quanto coisas de que não se gosta. Mudar é deixar e assumir, o que e quem for necessário.

Rosemiro A. Sefstrom

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Montesquieu

Neste ano comemoramos os 259 anos de falecimento de um dos grandes filósofos políticos do século XVII. Charles-Louis de Secondat ou como era conhecido Charles de Montesquieu nasceu em um castelo próximo a cidade de Bordeaux em janeiro de 1689 e faleceu em 10 de fevereiro de 1755. Montesquieu veio de uma família abastada o que lhe garantiu bons estudos, onde teve formação iluminista, legando a sua opinião um tom sempre áspero e duro a monarquia absolutista. Um homem de boa formação e importante escritor, deixando obras como Cartas Persas de 1721, também O Espírito das Leis de 1748, participando inclusive da elaboração da primeira Enciclopédia, entre outras obras.
No século em que Charles nasceu houveram muitas modificações na forma de pensar do povo europeu. Uma das grandes transformações foi o Tratado da Vestfália (1648), que depois de longos anos do embate entre a Igreja e os Protestantes afirmam que o Estado tem autonomia para decidir qual seria sua religião oficial. Nesse período a França vivia a monarquia absolutista, forma de governo em que o pode é centralizado nas mãos de um único governante. Seu país se dividia em três classes ou, como chamavam, os três estados: o clero, a nobreza e o povo. Sendo que só a última classe social pagava os impostos que mantinha a luxuosa vida da corte no Palácio de Versalhes.
Charles nasceu em um dos períodos de transição na política francesa e com certeza contribuiu de maneira decisiva para que a revolução tivesse êxito. Lembrando que ele viveu em um período em que havia um único governante com poderes totais ele desenvolve a teoria política da separação dos poderes. Para Montesquieu haveriam três poderes, cada um com a incumbência de cuidar de uma parte da administração pública. Também, é importante lembrar que Charles era formado em direito e depois da morte do tio assume o título de Barão e a presidência do parlamento de Bordeaux.
Em sua proposta os três poderes seriam o legislativo, o executivo e o judiciário. O legislativo é formado por um parlamento que tem por objetivo elaborar leis que serão aplicadas a população. O segundo poder, ou seja, o executivo, é desempenhado por um governante que tem por objetivo fazer com que se cumpram as leis. Já o judiciário compõe a terceira esfera de poder do estado, aqui se aplicam os julgamentos às partes conflitantes. Com essa divisão, desde a criação das leis, aplicação e julgamento de eventuais atritos entre partes o poder permanece livre das decisões unilaterais.
Hoje a colaboração de Charles-Louis de Secondat é sentida em praticamente todos os países democráticos de todo o mundo, países governados pelo povo e para o povo. Mas falta muito ainda para que possamos atingir objetivos como aqueles que inspiraram o Barão de Montesquieu. O Egito acordou depois de trinta anos sendo governado por um ditador, pôs seus medos de lado e entrou na briga pelos seus interesses. Para eles foram necessários trinta anos, quantos outros serão para que possamos transformar nossas velhas estruturas e fazer a tão falada Reforma Política?

Rosemiro A. Sefstrom

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Minha “Face”

Na década de oitenta, a popularização do telefone possibilitou ao ser humano uma maior conectividade. Nos anos noventa, o telefone móvel e o computador passaram a fazer parte da vida das pessoas, tornando-as mais próximas. No fim dos anos noventa e início do século vinte e um, com a popularização da internet boa parte das pessoas teve acesso a um novo mundo: o digital. Através do mundo digital as possibilidades de comunicação se tornaram praticamente infinitas, onde uma pessoa pode instantaneamente se comunicar com uma pessoa do outro lado do mundo.
Na carona da conectividade surgiram sites especializados em criar teias de relacionamento, as redes sociais, sendo que o primeiro a se popularizar foi o Orkut. Este site foi criado em 2004 e leva o nome de seu criador, o engenheiro Turco Orkut Büyükkökten. Nesse site as pessoas criavam contas onde disponibilizavam uma série de informações suas que eram compartilhadas com pessoas que faziam parte de sua rede de relacionamento, os amigos. Essa ferramenta rapidamente se tornou febre pelo mundo, mas realmente ficou famosa no Brasil, onde chegou a deter cinqüenta por cento de seus usuários. Na carona do Orkut surgiu o Facebook, este criado por Zuckerberg,em 2004, junto com Dustin Moskovitz e Eduardo Saverine Chris Hughes, quando eram estudantes da Universidade Harvard. O Facebook, assim como o Orkut segue a mesma linha, onde pessoas colocam seus conteúdos, os quais são compartilhados com os amigos.
Com a criação desses sites, abriu-se a possibilidade de um novo modo de se expressar e se expor, ou seja, foi criado um novo canal de comunicação, mas também de exposição da pessoa.
Em Filosofia Clínica temos um tópico, assim como um submodo, que são chamados de Expressividade. De forma sucinta, Expressividade é a parte da clínica filosófica que se ocupa em saber o quanto de mim está naquilo que comunico. Relacionando a febre das redes sociais e a expressividade pode ser proposta a questão: quanto daquilo que é postado no Facebook realmente representa quem você é? Quando uma pessoa posta seu conteúdo ela pode ou não estar falando muito de si mesma, algumas pessoas apenas encontraram neste site uma maneira de construírem a sua verdadeira “Face”.
Muitos ao serem interpelados em torno do que postam, curtem, comentam ou compartilham dizem ser apenas brincadeira. Mas, seria interessante pensar o quando sua “Face” pode ficar evidente para quem nunca te viu. Você pode dizer que aquilo que se encontra no seu Facebook não é você, mas quem não conhece e avalia pelo que é postado, curtido, comentado ou compartilhado pode não achar a mesma coisa. Pense que postar seria o mesmo que dizer, pintar, cantar, ou seja, comunicar a uma outra pessoa seus conteúdos. No Facebook se comenta para centenas. Veja que interessante, tudo o que você disser pode ser usado contra você por centenas de pessoas de uma forma facilitada, pois  está documentado.
Além de se postar, que seria o equivalente ao falar, ainda se pode curtir, ou seja, aprovar o que outras pessoas postam. Assim, ao curtir você está dizendo que aprova, que é isso mesmo, que é legal. Nos comentários, cada um coloca claramente sua opinião. Por fim compartilhar, sendo que muitas pessoas não têm a menor ideia do que isso quer dizer: compartilhar que dizer fazer parte daquilo. A atitude de compartilhar é dizer que aquilo que a pessoa postou também está em você e você oferece isso aos outros, ou seja, o que você compartilha pode ser a sua “Face” diante dos seus “amigos”.

Rosemiro A. Sefstrom

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Meu corpo é uma jaula

Assistindo a um famoso seriado estadunidense, Dr. House, ouvi uma canção interpretada por Peter Gabriel intitulada “My body is a Cage”. Essa expressão quer dizer, “meu corpo é uma jaula”, ou seja, “o corpo é o que me prende”. No decorrer da música, Peter diz que o corpo é uma jaula, mas que sua mente é a chave. O restante da música é composta por uma série de emoções que localizam a pessoa muito para baixo, onde ela vive um sofrimento profundo, mesmo dizendo o contrário. Ela está muito mal porque seu corpo é uma jaula, pois o impede de dançar com quem ama, mas sua mente é a chave para sair disso. Para ele, pelo menos na música, a mente é o caminho a seguir para sair do que lhe estiver impedindo de chegar perto de quem ama.
Passei algum tempo pensando nisso e nas pessoas que conheci pela vida. Para muitas delas seu corpo sempre será uma jaula. Pessoas como estas fizeram da mente o meio através do qual vivem sendo que ao corpo resta apenas realizar e acompanhar, pelo menos tentar. São corriqueiras as expressões que denotam a falta de agilidade do corpo frente a uma mente tão rápida. Expressões como: “precisaria ao menos três de mim para o que pensei em fazer hoje”; “eu ainda estou aqui, mas minha cabeça já está lá na frente”; “sou desastrado, pois acho que já fiz alguma coisa, mas meu corpo ainda está fazendo”. No caso do autor da música e da música em si, diz que suas emoções não podem ser vividas por causa de seu corpo. Para muitas pessoas é assim: se não fosse o corpo seriam o casal perfeito, os pensamentos, as ideias e tudo o mais têm a mesma velocidade, mas seus corpos não acompanham. Pessoas assim normalmente se encontraram cedo demais ou tarde demais.
Em outros casos a mente é justamente o que torna inviável as experiências do corpo e não uma solução. Essas pessoas são aquelas que vivem através do corpo e a mente é um acompanhante que pode ou não ser agradável. Quando o corpo estiver bem, os pensamentos dessas pessoas estarão bem, como exemplo podemos citar: “quanto estou com sono não consigo pensar em nada”; “se estiver com fome não consigo raciocinar”; “quando estou doente não consigo me concentrar nem na leitura”. Estas expressões dizem com clareza que o ponto de partida é o corpo, para estas pessoas a chave para viver bem com o que amam está longe da mente. Pessoas assim, para viver bem com o que amam devem estar com o corpo bem, assim poderão pensar e realizar as coisas com mais clareza. Para estas pessoas a prisão pode ser o pensamento, quando não conseguem parar de pensar algo ruim, quando estão com medo, quando cometem pecados. A chave será viver as coisas do corpo, as sensações, cheiros, cores, gostos e sons.
Aqui estão apenas dois exemplos de possibilidades da relação entre o corpo e a mente, em cada um tanto o corpo quanto a mente são e se relacionam de maneira diferente. Alguns serão mais de acordo com o corpo e suas vivências serão mais sensoriais, já outros terão a maior parte de suas vivências enquanto ideias, conceitos, abstrações. O que fará do corpo ou da mente uma prisão é o que não me deixa sair e a chave para isso dependerá de como a prisão foi construída. Em cada um de nós estão as chaves para abrir os cadeados existenciais que forem necessários abrir.

Rosemiro A. Sefstrom

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Verdade ou consequência

Verdade, aletheia, véritas, emunah. Todas estas palavras referem-se à correspondência entre o que foi dito e o que se apresenta. Na terapia, ao longo do tempo tenho me deparado com muitas verdades, ou seja, fatos apresentados pela pessoa que lhe são tão evidentes a ponto de não gerar dúvidas. Um dos casos que me chama atenção é quando uma pessoa relata que fica ao lado de alguém por não ter escolha, porque se entende responsável pelo outro. Uma pessoa que relata isso justifica dizendo que o outro precisa dele financeiramente, porque sozinho não saberia se virar, porque é frágil emocionalmente, cairia em depressão. Em cada uma das justificativas a verdade é clara: é preciso ficar porque o outro depende desta pessoa.
Numa das consultas ouvi uma história que há muito tempo não ouvia. A história conta de um caixeiro viajante, vendedor que ia de cidade em cidade vendendo produtos que comprava diretamente na fábrica. Havia numa vila um menino que tinha uma grande admiração pela profissão e sempre que o caixeiro passava na cidade ele queria ir junto. Quando tinha certa idade pediu aos pais e com o consentimento destes partiu com o caixeiro fazer vendas pelas cidades vizinhas. Numa determinada cidade o caixeiro viu uma família muito pobre que tinha uma vaca muito bonita e que dava muito leite. O caixeiro combinou com o menino: “Vamos pedir pouso aqui e durante a madrugada roubamos a vaca, o lucro de sua venda dividimos meio a meio”. O menino concordou e foi assim que o fizeram, acordaram de madrugada e levaram a vaca da família. Foram até uma cidade vizinha e a venderam, o dinheiro foi dividido tal como o caixeiro tinha dito, mas aquilo começou a incomodar o menino. Pensava ele: “Mas era a fonte de alimento e recurso da família, bebiam o leite, vendiam o queijo, como ficarão sem a vaca?” Quando o menino chegou novamente em casa decidiu não seguir novamente em viagem, guardou o dinheiro com o intuito de ir devolver, mas não conseguia ir.
Depois de muito tempo, quando atingiu a maioridade, agora homem, decidiu que não viveria mais com aquele peso. Pegou suas coisas, o dinheiro que entendia ser justo devolver pelo mal causado e partiu. Chegando ao local onde havia a pequena cabana viu uma casa grande, plantações, pomares. Vendo isso o remorso bateu forte. Mesmo assim tocou a campainha da casa para pedir informações sobre as pessoas que moravam na cabana que ali ficava. Foi recebido pelo dono. Perguntou sobre uma família que vivia numa cabana que ficava no mesmo local. O dono da grande casa lhe disse que ele mesmo morava ali, que eram muito pobres, tinham como único bem uma vaquinha. Certa noite, depois que um caixeiro viajante e seu ajudante passaram por ali a vaquinha fora roubada. Com isto ele pegou o pouco dinheiro que tinha e comprou algumas sementes, cultivou e assim começou a prosperar até chegar ao ponto atual. E disse ainda que era grato ao ladrão que o libertou da dependência daquela vaca.
Em muitos casos uma pessoa entende que não pode partir porque o outro depende dela, mas a verdade é que a sua permanência reforça a dependência. Em outras palavras, um marido que não termina o casamento porque a mulher depende dele a mantém dependente continuando ao seu lado. Uma mãe que vai ao apartamento do filho para fazer a limpeza porque o filho precisa pode estar criando dependência. O fato é que muitos não querem encarar a verdade de que são eles que tornam as pessoas próximas dependentes, ou seja, a sua verdade é na realidade uma consequência.

Rosemiro A. Sefstrom

terça-feira, 3 de junho de 2014

Meu coração me traiu!

Cada pessoa ao se conectar a uma outra, ou, como se diz em Filosofia Clinica, ao construir uma interseção com a outra, põe uma série de conteúdos em comum. Algumas pessoas colocam mais conteúdos nessa interseção, outras muito menos, de modo que se constrói um espaço que forma a relação. A essa construção compartilhada chamamos de relação, conexão, amor e outras milhares de palavras que apontam a interseção entre duas pessoas. Mas, há um problema, como saber se a pessoa com quem estou conectado é a pessoa certa? Como saber se numa relação em que dedico o meu amor a outra pessoa está interessada em continuar comigo?
Um relacionamento pode se iniciar por vários motivos, basta ver nos filmes: alguns começam porque a moça ou moço é bonito, rico, inteligente, esperto, engraçado, mas isso pode ser apenas um termo de passagem de um encontro em um relacionamento. Depois de um primeiro contato, o casal começa a construção da interseção, de modo que cada um põe os conteúdos em comum e partilha os conteúdos do outro. É ilusão achar que os relacionamentos começam ou duram e até mesmo acabam por causa de amor. Para muitas pessoas o amor é apenas uma sombra, sem cor, sem forma, elas sabem que até pode existir, mas não estão interessadas. Cada relacionamento tem suas peculiaridades, tanto a literatura quanto a vida são ricos em exemplos. Tenho certeza que não sou o único que conhece  um casal que vive de aparências, isso segundo os vizinhos. Se a aparência faz o casal estar junto, vivem bem assim, o que há de errado? Ou será que a maior parte dos homens e mulheres quando vão para a balada estão em busca só de uma mente brilhante?
Mas, existem muitos casos nos quais é realmente o amor que faz a relação acontecer. A menina ou o menino realmente ama seu par, faz juras e espera que essa sensação boa dure tanto quanto possível. Quando isso não acontece, às vezes a decepção é muito grande, porque a pessoa depositou todo o seu amor em uma pessoa que não era a certa. Mas como saber? O coração simplesmente diz, aponta para a pessoa e nada se pode fazer contra ele, mas ele, assim como razão, também erra. Mas vamos fazer ainda pior, digamos que uma moça tenha plena certeza de que aquele menino não é para ela, mas ainda assim se apaixona. O coração traiu.
Para a pessoa que vive o dilema, não parece tão simples quanto as palavras que escrevo, porque para ela a razão aponta um caminho e o coração outro. Quando a razão tem mais força, facilmente o problema é resolvido, mas algumas vezes o coração tem mais força. São aqueles casos em que, contra todas as possibilidades, a menina ou menino se apaixona pela pessoa errada. Uma situação ainda mais dura acontece quando tanto a emoção quanto a razão tem força, nestes casos a dúvida é o que fica evidente. O caso mais interessante acontece quando as emoções não conversam com a razão, parece estranho, mas acontece. É o caso de uma pessoa que não tem a menor ideia do porque, mas tem uma vontade louca de estar com a outra. Nesse caso a razão e a emoção não se conversam.
Para não ser traída ou traído pelo coração observe em sua história as vezes em que seu coração indicou o caminho e se esse caminho foi bom. Assim como o coração, nossa razão também pode errar.  Não há como dizer quem é melhor, razão ou emoção, mas cada um deve pesquisar em sua história de vida quando usou um ou outro para decidir. Quando perceber o uso da razão, preste atenção nos resultados da decisão, quando for o caso da emoção, a mesma coisa. Você pode ser enganado pela emoção, mas também pode tentar conhecê-la e, quem sabe, tornar-se um pouco mais independente.

Rosemiro A. Sefstrom

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Matemática Existencial

Algumas pessoas veem o mundo através de números e contas.  Há alguns dias atrás, sentado no cafezinho, ouvia a conversa de duas mulheres sobre seus relacionamentos. A primeira delas dizia: “vivo com meu marido há quatro anos, tive cinco filhos, subi dois níveis na minha carreira profissional”. A outra falava que estava no quarto namorado, devendo metade de tudo que tinha e sem nenhum filho. Prestando atenção à conversa alheia fiquei interessado em saber o resultado de cada uma das duas contas, como estas ficariam depois do sinal de igual. A primeira colocou que estava cem por cento satisfeita com sua vida, já a segunda atribuiu nota sete a sua vida atual. Agora, será que o cem por cento da primeira equivale aos sete da segunda? Ou será que o sete vale mais do que o cem por cento? A conta existencial feita pelas mulheres deve ser vista do ponto de vista de cada uma, ou seja, o valor de cada termo da equação deve ser pesquisado.
O exemplo ilustra o modo como algumas pessoas olham para o mundo: para elas a vida é um grande escritório contábil. Em Filosofia Clínica casos como estes são entendidos como pessoas que têm como determinante o tópico 07, Termos Universais, Particulares e Singulares. Cada pessoa em sua Estrutura de Pensamento (EP) leva matematizações em proporções diferentes, o mais importante: cada pessoa atribui valores diferentes a cada produto presente na equação. Pense na esposa que chega em casa depois de um dia de trabalho e vê a casa toda bagunçada, filhos sem banho tomado, janta por fazer, sendo que o marido passou o dia em casa. Que conta faria essa mulher? É provável que ela diga, trabalhei o dia inteiro, chego em casa cansada, a casa está bagunçada, filhos sem banho tomado, janta por fazer, é isso que eu ganho por ter casado com um homem folgado. Veja, a conta dela se justifica pela opção de casamento.
Algumas pessoas fazem contas muito simples, os termos colocados na equação são inteiros como: beleza mais dinheiro igual amor à primeira vista. Os conceitos utilizados pela pessoa são valorizados de tal maneira que propiciam a ideia de casamento. Essa conta pode ser feita de maneira simples: mentiroso mais traição igual a fim do relacionamento. Os números para pessoas que fazem contas simples são inteiros, são contas fáceis de se perceber. Contas mais difíceis são aquelas nas quais a pessoa começa a pesar frações, como aquela que pesa: dois maridos, mais menos um filho, mais uma carreira de sucesso. Como essa conta termina? Representando essa conta em números: 2 + (-1) + 1 =?  Outro tipo de conta, ainda mais complexa é aquela de pessoas que colocam por formas, como: eu era inteiro até que me foi arrancada uma parte, agora sou apenas uma parte de mim. Esse relato é frequente em pessoas que matematizam frações. Para algumas pessoas o que lhes deixou incompletas foi a morte de um filho, para outros a perda de um membro, uma perna, um braço.
Matematizar, fazer contas, quantificar as coisas da vida para alguns é inadmissível, para outros é parte da sua existência. São pessoas que olham para mulher, filhos, amigos, trabalho, amor, como coisas que podem fazer parte de uma equação que terá um resultado positivo ou negativo. Algumas pessoas vivem muito bem com resultados negativos para o mundo, mas positivos para si, como diz o ditado: “Mais vale um gosto que um tostão no bolso”. Outras pessoas põem valor em tudo, ao mesmo tempo em que estas coisas valem nada diante da necessidade de um filho. É necessário verificar em cada um o que tem e o que não tem valor. Infelizmente algumas pessoas dão valor àquilo que em verdade nada vale.

Rosemiro A. Sefstrom