Em alguns
anos de terapia comecei a perceber que algumas pessoas são afligidas por um
pequeno problema: a passagem das coisas. Uso a palavra coisas porque tudo o que
está ao redor destas pessoas não pára, não permanece exatamente como está, inclusive
elas mesmas. Este pequeno problema começa a aparecer quando estas pessoas
começam a pensar em sua vida como uma linha do tempo, deixam de olhar a vida
como experiências isoladas e passam a perceber o contínuo. Ao perceber a
transitoriedade descobrem que estão sujeitas também às mudanças e em cada caso
existem mudanças que assustam mais. Para algumas pessoas o que as assusta é a
possibilidade que a passagem do tempo possa levar as pessoas que elas amam,
pai, mãe, irmão, marido, filhos, etc. Outras pessoas têm medo de perder sua
aparência física , são devotos do próprio corpo, passam horas ao dia cultivando
a beleza que temem perder. Um último exemplo são as pessoas que veem na
passagem do tempo o problema de terem de mudar, se adaptar, renovar, ou seja, para
elas o ideal é que as coisas continuassem sempre assim, pois estavam boas do
jeito que estavam.
Estas
pessoas que se assustam com a passagem do tempo, em boa parte, estão agarradas
a algo que têm medo de perder com o passar dos dias. Não percebem que a vida acontece no agora, que tudo o que
está a sua volta faz parte da vida como transitoriedade, ou seja, são coisas
que estão de passagem, inclusive elas mesmas. Essa transitoriedade remete a um
conceito simples: participação, ou seja, tudo quanto faz parte de minha vida
agora, participa de minha vida agora. Hoje você tem um carro modelo X, ano X,
valor X, mas daqui há algum tempo compra outro e este deixa de participar de
sua vida. Uso o carro como um primeiro exemplo desta participação porque é um bem
do qual muitas pessoas se desfazem com certa facilidade. Mas uma casa também
pode servir de exemplo, a casa ou apartamento no qual você vive participa de
muitas coisas. É interessante perceber que tudo o quanto pode ser vivido está
apenas de passagem, elas participa de sua vida e você participa destas coisas,
mas apenas momentaneamente. Mesmo as coisas que estão há muito tempo com você
também estão de passagem, apenas têm um tempo de passagem maior que outras.
Quanto for
possível perceber que tudo participa de nossa vida e nós participamos destas
coisas se tornará possível escolher quando e quanto participar. Se você
percebe, por exemplo, que seu marido está de passagem em sua vida, a
participação dele pode ser muito melhor aproveitada. O mesmo pode acontecer com
ele em relação a você, ele pode querer participar muito mais de você. Pense em
sua casa, o quanto você participa daquilo que dispõe? Há muitos dos casos em
que a mulher ou o marido compram objetos e os guardam, estes objetos acabam não
participando de suas vidas de fato, estão ali, deixados de lado. A participação
lembra que é possível viver ao máximo um fim de semana na praia, porque ele
passa, mas eu posso participar dele ou ficar chateado porque ele vai passar.
A noção
estática da vida faz com que boa parte das pessoas pare no tempo, deixe de se
atualizar, deixe de se melhorar. Por incrível que pareça, algumas pessoas
deixam de participar da própria vida. Participar das coisas que estão ao nosso
redor e permitir que elas participem de nossa vida é uma das maneiras de viver
o agora, tanto com vinte quanto com cinqüenta anos de idade. Em cada etapa a
participação é diferente, não melhor nem pior, apenas diferente.
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